Photo: Toshiko Okanoue
inversamente, o medo lança fora o amor.
E não só o amor. O medo também expulsa a
inteligência, expulsa a bondade, expulsa
todo o pensamento de beleza e verdade."
Aldous Huxley
Photo: Toshiko Okanoue
inversamente, o medo lança fora o amor.
E não só o amor. O medo também expulsa a
inteligência, expulsa a bondade, expulsa
todo o pensamento de beleza e verdade."
Aldous Huxley
São claras as crianças como candeias sem vento,
seu coração quebra o mundo cegamente.
E eu fico a surpreendê-las, embebido no meu poema,
pelo terror dos dias, quando
em sua alma os parques são maiores e as águas sujas
param junto à eternidade.
As crianças criam. São esses os espaços
onde nascem as suas árvores.
Enquanto as campânulas se purificam no cimo do fogo,
as crianças esmigalham-se.
Seu sangue evoca
a tristeza, tristeza, a tristeza
primordial.
— Enlouquecem depressa caídas no milagre. Entram
pelos séculos
entre cardumes frios, com o corpo espetado nas luzes
e o olhar infinito de quem não possui alma.
Seu grito remonta ao verão. Inspira-as
a velocidade da terra.
As crianças enlouquecem em coisas de poesia.
Escutai um instante como ficam presas
no alto desse grito, como a eternidade as acolhe
enquanto gritam e gritam.
— É-lhes dado o pequeno tempo de um sono
de onde saem
assombradas e altas. Tudo nelas se alimenta.
Dali a vida de um poema tira
por um lado apaixonadamente; por outro,
purificação.
Nelas se festeja a imensidade
dos meses, a melancolia, a silenciosa
pureza do mundo.
Quem há-de pensar para as crianças, sem ter
espinhos na saliva e as vozes
desertas até ao fundo? É vendo-se aos espelhos,
no seguimento da noite,
que as crianças aparecem com o horror
da sua candura, as crianças fundamentais, as grandes
crianças vigiadoras —
cantando, pensando, dormindo loucamente.
Não há laranjas ou brasas ou facas iluminadas
que a vingança não afaste.
As crianças invasoras percorrem
os nomes — enchem de uma fria
loucura inteligente
as raízes e as folhas da garganta.
Aprendemos com elas os pecados do ar,
a iluminação, o mistério
da carne. Partem depois, sangrentas,
inomináveis. Partem de noite
noite — extremas e únicas.
— E nada mais somos do que o Poema onde as crianças
se distanciam loucamente.
Loucamente.
herberto helder
poesia toda
a colher na boca
assírio & alvim
Alice fotografada por Lewis Carroll
— Você me ama? Perguntou Alice.
— Não, não te amo! Respondeu o Coelho Branco.
Alice franziu a testa e juntou as mãos como fazia sempre que se sentia ferida.
—Vês? Retorquiu o Coelho Branco.
Agora vais começar a perguntar-te o que te torna tão imperfeita e o que fizeste de mal para que eu não consiga amar-te pelo menos um pouco.
Sabes, é por esta razão que não te posso amar. Nem sempre serás amada Alice, haverá dias em que os outros estarão cansados e aborrecidos com a vida, terão a cabeça nas nuvens e irão magoar-te.
Porque as pessoas são assim, de algum modo sempre acabam por ferir os sentimentos uns dos outros, seja por descuido, incompreensão ou conflitos consigo mesmos.
Se tu não te amares, ao menos um pouco, se não crias uma couraça de amor próprio e de felicidade ao redor do teu Coração, os débeis dissabores causados pelos outros tornar-se-ão letais e destruir-te-ão.
A primeira vez que te vi fiz um pacto comigo mesmo: “Evitarei amar-te até aprenderes a amar-te a ti mesma!”
Lewis Carroll, Alice no País das Maravilhas
Que amante dos diabos é que eu sou?
Prometi-lhe toda uma série de experiências inesquecíveis num futuro próximo, e depois adormeci com o seu corpo colado no meu.
De manhã acordei doente. Olhei pra ela nua ao meu lado. Mesmo depois da véspera, tudo;
Ela era um verdadeiro Milagre. Nunca tinha conhecido uma Mulher tão Imensa, Livre,
Bela, Forte, Corajosa; tão Brava quanto
Doce e Inteligente.
Quem tinham sido os seus amores?
Por que é que falharam?
Nada mais importa.
Se tudo é menos do que Agora.
Charles Bukowski
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...
Fernando Pessoa - 1928
"A suposição de que a plenitude emocional depende inexoravelmente da presença de uma parceria amorosa é, em si mesma, uma ilusão sedutora, alimentada por convenções sociais e narrativas populares. Sob essa perspectiva, há uma tentação irresistível de buscar fora de si mesmo a fonte última de contentamento, depositando nas mãos de outro ser humano a chave para a felicidade. Contudo, essa visão, por mais persuasiva que possa parecer, está fadada ao desencanto e à insatisfação.
A felicidade genuína não pode ser concebida como uma mercadoria pronta para ser adquirida, tampouco como uma entidade externa a ser encontrada e conquistada. Ela é um estado interno que se desenvolve a partir da compreensão e do cultivo de um profundo amor-próprio e autenticidade. É na descoberta de quem somos, na aceitação de nossas virtudes e imperfeições, que encontramos as bases sólidas para a felicidade duradoura.
Ao transferir a responsabilidade por nosso bem-estar a um relacionamento romântico, incorremos em uma armadilha emocional. Colocamos expectativas desmedidas sobre o outro, sobrecarregando-o com o fardo de suprir todas as nossas necessidades afetivas. No entanto, é uma ilusão imaginar que uma única pessoa possa satisfazer todas as dimensões de nossa existência.
Ademais, devemos considerar que a busca frenética por um parceiro pode levar à desvalorização da individualidade, à submissão a normas sociais obsoletas e à renúncia de nossos próprios desejos e aspirações. Ao nos ancorarmos em relacionamentos como única fonte de alegria, corremos o risco de negligenciar nossos próprios interesses e necessidades, tornando-nos reféns da vontade alheia.
Nesse sentido, é crucial cultivar uma compreensão madura do amor e da felicidade, reconhecendo que a plenitude não é alcançada através da dependência emocional, mas sim da interdependência saudável. Os relacionamentos amorosos, quando baseados em reciprocidade, respeito mútuo e apoio mútuo, podem ampliar nossas experiências e trazer uma satisfação adicional. No entanto, eles nunca devem ser vistos como o único caminho para a realização pessoal."
Gabriel García Márquez
Photo: Toshiko Okanoue "O amor lança fora o medo; mas, inversamente, o medo lança fora o amor. E não só o amor. O medo também expulsa a...